Ficha de Leitura IV - A Observação

A observação
In R. Fernandez-Ballesteros (Ed.) Introducción a la Evaluación Psicológica I, (3ª ed.,pp.323-355). Madrid. Ediciones Pirámide


A observação, em termos de avaliação psicológica, constitui uma estratégia fundamental do método científico.
Este artigo propõe-se efectuar uma análise desta estratégia de avaliação, recorrentemente utilizada por qualquer das técnicas ao dispor da ciência enquanto forma de recolher informação, não descurando as características necessárias para que seja considerada um método científico.
Assim, a observação consiste na percepção deliberada de comportamentos de um determinado sujeito, por um observador treinado (participante ou não participante) que poderá incluir pessoas próximas do observado. Esta poderá ser realizada em situação natural ou situação artificial, mediante um protocolo ou uma folha de registos previamente preparada em função da estrutura pretendida, com vista ao registo sistemático dos comportamentos observados e que possam suscitar respostas. Neste método, o observador poderá efectuar inferências de diferentes níveis relativamente ao facto em observação: podem observar condutas; inferir atributos às condutas; observar um facto presente que representa a expressão de condutas passadas.
A definição destas dimensões de observação permitem ainda, definir a qualidade e rigor da observação, considerando se esta será mais rigorosa quando se observam em situação natural unidades de análise modulares com baixo nível de inferências, registadas no momento em que ocorrem, através de um protocolo estruturado e por um observador treinado não participante [pp.162,163].


Unidades de análise (O que observar?)

Segundo Fiske, o conceito de unidade de observação pode ser abordado de diferentes formas. Por unidade pode entender-se o objecto que se pretende estudar (uma pessoa, grupo, instituição, etc.). Não se pretende avaliar as pessoas como objectos, mas sim as suas manifestações de conduta. Assim, o objecto observado seria um evento de conduta, que acontece num contínuo temporal e, por isso mesmo, neste caso a unidade poderia referir-se a um segmento concreto no tempo, mais ou menos amplo, do contínuo da conduta.
O observador pode realizar, ainda, distintos níveis de inferência (descrição, classificação, explicação) no que diz respeito às unidades de acto observadas. Podem, igualmente, ser consideradas unidades de análise as interacções entre as actividades das pessoas e os elementos ambientais - estímulos físicos e sociais (ver anexo I) [p.163].

- Contínuo do comportamento

Numa perspectiva ecológico-naturalista o objectivo é observar todo o contínuo de conduta com o propósito de registar, de forma descritiva, a maior parte dos eventos que ocorrem num contexto natural em amplas unidades de tempo. Não existe, assim, qualquer especificação prévia relativamente ao que se vai observar.
Convém referir que mesmo quando se elaboram categorias de conduta e/ou se especificam quais as unidades a observar, requerer-se-á sempre uma observação assistemática [pp.163,164].

- Atributos
Os psicólogos do traço, psicodinâmicos e construtivistas utilizaram a observação como base para a obtenção de atributos e para o exame de outras construções teóricas. Assim, inferem-se determinadas características a partir da observação da conduta manifesta – verbal, não verbal ou espacial. Na observação destas unidades podem utilizar-se intervalos temporais amplos.
Dado que a utilização de atributos como unidades de análise estão em relação com marcos teóricos concretos, alguns autores não consideram estas como unidades apropriadas de análise da observação sistemática [p.164].

- Condutas
De acordo com Cone e Foster, a definição das unidades de observação da conduta manifesta varia num contínuo de molaridade-molecularidade, uma vez que qualquer conduta pode ser descrita numa série de aspectos de maior ou menor especificidade e poderão formar parte de categorias de conduta como a desatenção, por exemplo [p.164].

- Interacções
Por vezes, a unidade a observar não está formada por umas condutas descritas previamente, a não ser por uma relação sequencial entre dois eventos procedentes de duas ou mais pessoas ou entre uma pessoa e uma dimensão ambiental. Estas unidades de análise são fundamentalmente utilizadas pelos avaliadores que perseguem a indagação das relações funcionais entre eventos [p.165].

- Produtos de conduta
Grande parte da observação em avaliação realiza-se sobre produtos de conduta. Observa-se o resultado de um conjunto de actividades internas ou externas que os sujeitos realizaram em situações tanto naturais como artificiais.
Dois tipos fundamentais de observações podem incluir-se: os produtos de conduta procedentes das execuções do sujeito no passado, (medidas não reactivas), e os produtos de execuções que o sujeito realiza a partir de determinadas tarefas que o avaliador lhe apresenta [p.165].
Como exemplo temos primeiro as medidas de erosão, que se referem a destruições, danos ou outras alterações físicas que existem no ambiente habitual do sujeito e que se terão originado como produto da sua conduta.
Por outro lado, as medidas de “rastreio” correspondem aos produtos da conduta do sujeito ao utilizar objectos ou ao consumi-los (por ex. as bebidas consumidas por um alcoólico).
Por último, as medidas de arquivo, as mais interessantes na avaliação, são aquelas que foram registadas em documentos ou relatos, geralmente de forma escrita. Podem incluir-se dados tão importantes como os cadernos escolares, pinturas ou desenhos, as notas do curriculum académico e muitos outros documentos pessoais que, procedentes do passado, são o resultado da realização de determinadas actividades por parte do sujeito na sua vida quotidiana passada e que podem resultar de um grande interesse na avaliação psicológica [p.166].

- Unidades de medida (o que medir da unidade?)
Segundo Johnston e Pennypacker, não devem confundir-se as unidades de observação com a sua especificação quantitativa. Assim, independentemente de observar comportamentos, interacções, atributos, na altura de dar uma versão quantificada das mesmas, terá que se proceder à selecção das unidades de medida que vão ser adoptadas [p.166].

Ocorrência - Em certas situações o que interessa é a ocorrência de um evento, isto é, a constatação de que um fenómeno se dá ou não. Neste caso, o tudo ou nada, na aparição da unidade de análise em questão não se relaciona com nenhum outro sistema de medida, como por exemplo o tempo. A ocorrência é a dimensão mais simples do observado [pp.166,167].

Ordem - Segundo Anguera, a ordem consiste na explicitação das sequências das distintas ocorrências de conduta [p.167].

Frequência - Principalmente utilizada no registo de condutas, classes de conduta e interacções, a frequência faz referência à extensão na qual um determinado evento ocorre numa unidade de tempo, que, segundo Kazdin, apresentam uma série de características: a frequência ou taxa de aparecimento de um evento é uma medida fácil de obter quando se trata de unidades bem definidas; procura reflectir, melhor que nenhum outro parâmetro, alterações através do tempo; expressa o montante total de acontecimentos de um determinado ciclo que terá sucedido durante o tempo que durou a observação [p.167].

Duração - Não interessa só obter dados sobre a frequência ou a ordem de uma determinada conduta, mas também sobre a sua duração.
As propriedades temporais de um determinado evento, podem ser três: o intervalo entre o começo e o final de uma determinada actividade, que é a duração propriamente dita; o intervalo entre a apresentação de um estímulo e o começo de uma resposta, refere-se à latência da resposta; o intervalo entre as manifestações sucessivas observadas diz respeito ao intervalo inter-resposta [p.167].

Dimensões qualitativas - A medição da intensidade, magnitude ou adequação de uma unidade de observação pode realizar-se de formas distintas. Assim, a intensidade ou magnitude da agressão física pode estimar-se mediante a magnitude do dano infligido ao agredido.
Com a medição da adequação de uma conduta faz-se referência à sua apropriação social ou então ao seu grau de funcionalidade, ou seja, até que ponto uma actividade consegue ou não os objectivos propostos, medido através dos acertos ou erros que o sujeito faz ao executar uma tarefa e, portanto, são as características principais com que são valorizados os testes de execução [p.168].


Técnicas de Registo (Com que observar?)

Uma das condições da observação sistemática que permite a replicabilidade e controlo dos resultados é a forma como é estruturado o sistema de observação. É de referir, no entanto, que o modo como se realiza esta sistematização depende em grande parte do referencial teórico do observador [p.168].
Por outro lado, o nível de estruturação também pode variar dependendo da fase em que se efectua a observação. Posto isto, segundo Anguera (1981, 1990), a observação dever-se-á realizar segundo um plano em que, num primeiro momento, esta será realizada com o intuito de perceber quais os eventos relevantes que devem ser observados no objecto de avaliação. Após esta etapa, proceder-se-á então a uma observação sistemática, para a qual dispomos do auxílio de vários instrumentos de recolha de dados observacionais, os quais vão ser especificados abaixo [p.169].

- Registos Narrativos
No caso deste instrumento, o observador limita-se a tomar notas escritas ou orais, nas quais descreve/narra a situação observada. Estes registos apresentam um formato flexível, permitindo assim recolher informação acerca de variadíssimas características e circunstâncias das actividades do indivíduo – tempo, lugar, pessoas presentes, entre outras. Os registos narrativos são, frequentemente, auxiliadores no momento da elaboração de catálogos de conduta, sistemas de categorias ou de interacções [pp.169, 170].
Porém, a fiabilidade deste tipo de registos poderá ser afectada por duas fontes de erros (Cone e Foster, 1982). A primeira diz respeito ao facto dos observadores poderem utilizar diferentes descrições verbais para um mesmo comportamento ou padrão de comportamentos. A segunda, decorrente da primeira, refere-se à possibilidade de categorizar ou dar significados diferentes aos mesmos acontecimentos. Não obstante, estes tipos de erro poderão ser controlados se os observadores forem previamente treinados no uso de uma mesma linguagem descritiva das possíveis situações que se possam vir a observar [pp.169,170].

- Escalas de apreciação
As escalas de apreciação, ou estimação, são utilizadas quando se pretende quantificar, qualificar ou classificar as actividades do sujeito mediante definições comportamentais específicas, dimensões ou atributos de personalidade previamente determinados. São vários os tipos de escalas de apreciação, todavia todas elas pretendem avaliar em que medida uma determinada descrição é aplicável a um sujeito. O observador, geralmente, desempenha um papel participativo, realizando a observação em períodos distintos de tempo e podendo esta ser replicada posteriormente.
Estas escalas são úteis na medida em que nos possibilitam uma primeira aproximação com os comportamentos problemáticos e adaptativos do indivíduo, assim como o são os relatos de amigos próximos sobre o mesmo. Contudo, existe a possibilidade de o observador se deixar contaminar por opiniões externas e se provoque um efeito de halo que influencie, indevidamente, observações futuras [p.170].

- Protocolos/Registos observacionais de conduta
Os protocolos observacionais de conduta, também denominados por listas de características, abrangem uma série de condutas, classes de condutas, assim como as relações funcionais entre estas e outros acontecimentos contextuais. Os mais frequentes são:
  • Registo de condutas - Este tipo de técnica permite-nos constatar a ocorrência ou frequência de variadíssimas condutas previamente definidas como “condutas objectivo”, as quais foram seleccionadas de acordo com as informações recolhidas junto do observado e pessoas próximas do mesmo [pp.171,172].
  • Matrizes de interacção - Este procedimento está dirigido, exclusivamente, para a constatação das interacções produzidas entre o ambiente social e o comportamento, isto é, interacções produzidas entre dois ou mais indivíduos. Assim, em diversas ocasiões requer-se não só a avaliação de um sujeito, mas das interacções entre indivíduos ou entre um indivíduo e um grupo [pp.173,174].
  • Mapas de condutas - Segundo Anguera (1987), um mapa de conduta, também denominado de “formato de campo”, consiste numa observação sistemática de condutas específicas verificadas num determinado espaço (lugar, ambiente) e tempo (e.g., frequência da conduta num dado intervalo de tempo), tendo como objectivo analisar as relações entre condutas e variáveis ambientais [p.174].
- Códigos ou sistemas de categorias (ou esquemas de codificação)
São considerados os procedimentos de observação mais sofisticados, visto que, segundo Anguera (1991), a sua “estrutura proporciona suporte e cobertura àquelas condutas que, mediante a operação de filtragem correspondente, são consideradas relevantes de acordo com os objectivos da investigação”. Estes implicam a denominação, delimitação e definição de categorias dos eventos comportamentais e/ou contextuais que se pretendem observar, assim como articulam e regulam o modo como deve ser realizada a observação [pp.174-178].
Este procedimento, de acordo com Haynes (1979), comporta várias vantagens, entre elas: permitem um limitado mas amplo número de actividades a observar; proporcionam informação sobre comportamentos e/ou interacções complexas; permitem a comparação entre sujeitos e investigações; simplificam o trabalho de observação, uma vez que o treino num código pode servir para mais do que um caso; por ser um procedimento estandardizado apresenta maiores garantias científicas.

- Registo de produtos de conduta
Sendo os dois grandes tipos de observação, como foi referido anteriormente, os dados observáveis não reactivos e os resultados de execuções em situações naturais e artificiais, estes implicam, na sua maioria, o registo de medidas físicas (e.g., metros quadrados de relva destruída, quilos de lixo recolhido, número de garrafas de álcool consumidas por um alcoólico). O registo destes produtos/resultados é feito considerando o dia, a hora, o lugar, a situação, entre outros.
Outros resultados exigem não só medidas físicas mas também a valorização da qualidade do produto resultante da actividade humana, sendo necessário, para este efeito, outros conhecimentos que vão muito além da pura observação [p.178].

- Procedimentos automáticos de registo
Este procedimento foi elaborado para garantir o máximo de rigor científico na observação, facilitando a tarefa do observador, evitando os enviesamentos decorrentes das anotações do próprio observador e, também, atenuando os efeitos da reactividade dos indivíduos observados [p.178].
Assim, estes dividem-se em três grandes grupos:
  • Meios técnicos de registo - Permitem registar automaticamente eventos de conduta através de categorias previamente estabelecidas, cujos dados podem ser armazenados num computador, facilitando a análise dos resultados relativamente à ocorrência, duração, frequência, sequência, simultaneidade, entre outros, dos comportamentos a avaliar [pp.178,179].
  • Aparelhos de registo à distância ou ocultos - Com a finalidade de maximizar a validade externa dos dados obtidos em laboratório, foram elaborados dispositivos telemétricos (transdutor e radiotransmissor), que os sujeitos transportam consigo, permitindo o registo à distância de respostas fisiológicas e condutas motoras. Por outro lado, a fim de diminuir o constrangimento do sujeito face ao observador, utilizam-se frequentemente procedimentos tais como o magnetofone/gravador, câmara de vídeo ou espelhos unidireccionais. Ambas as técnicas levam a resultados mais fidedignos. No entanto, só podem ser administradas mediante o consentimento informado do indivíduo observado ou o dos seus representantes legais [p.179].
  • Observação mediante aparelhos - São técnicas que visam a amplificação da resposta, sendo esta registada através de procedimentos mecânicos, eléctricos e electrónicos, que não necessitam da presença do observador humano [p.179].
Para terminar, é importante referir que na hora de seleccionar uma técnica de registo para realizar a observação, deve-se ponderar qual a mais apropriada e qual a que melhor se poderá enquadrar no tipo de observação. É também de frisar que se podem utilizar técnicas em simultâneo.


Amostra (Quando e/ou a quem observar?)

Uma das tarefas que o observador deve empreender será a de estabelecer não só o que observar, mas também quando e como fazê-lo. Na medida em que a observação acarreta custos e limitações consideráveis, nomeadamente no que respeita ao tempo de observação e à selecção dos sujeitos, é necessário obter amostras significativas e representativas dos acontecimentos observados, segundo unidades de medida previamente seleccionadas.
Quando não é possível a realização de registos contínuos, o avaliador deverá considerar os seguintes factores relativos ao tempo de observação:
  1. Duração do tempo de observação (e.g., um dia, uma semana, um mês, etc.);
  2. Frequência da observação (e.g., uma hora diária ou durante um período de 15 minutos diários);
  3. Inicio e término dos períodos de observação, bem como a sua possível variabilidade temporal;
  4. Utilização ou não de intervalos de tempo para a observação e registo;
  5. Observação ou não em diversos contextos situacionais;
  6. Selecção do sujeito e do momento em que se regista o comportamento alvo de estudo [pp.180,181].
Passamos a analisar os diferentes tipos de amostra.

- Amostra do tempo
A observação compreende uma série de “tempos” (duração do tempo de observação; número de sessões a realizar; periodicidade; intervalos de observação/registo), os quais dependem dos objectivos da observação, bem como da disponibilidade do(s) sujeito(s). Quando não existem dados suficientes para estabelecer a duração e frequência da observação, dever-se-ão realizar períodos de pré-observação assistemática para obter a sua delimitação.
Quando os comportamentos objecto de estudo são muito frequentes, e tendo em conta que não é possível observar e registar em simultâneo, verifica-se a necessidade de efectuar intervalos de tempo: um primeiro período destinado à observação dos comportamentos e um segundo destinado ao seu registo.
Powell, Martindale y Kulp (1975) definiram três tipos de intervalos de tempo: intervalo total (não se regista a conduta caso esta não ocorra no intervalo total de tempo estabelecido), intervalo parcial (regista-se toda a conduta que ocorre numa fracção de intervalo de observação) e momentâneo (registam-se condutas ocorridas num momento predeterminado do intervalo de observação) [pp.181,182].
Duração da Observação – inversamente proporcional à frequência do acontecimento observado.

Sessões de Observação – dependem do tipo de acontecimento a registar e da complexidade do instrumento de registo utilizado.

Períodos de Observação – dependem do caso em avaliação e particularmente das situações nas quais ocorrem o comportamento alvo de estudo.

Intervalos de Observação/Registo – não deve exceder os 10 s de observação em amostras de intervalo parcial; 5 seg. para amostras de intervalo total; até 1 min. para amostras momentâneas.

- Amostras de situações
Este tipo de amostra tem como finalidade comprovar o universo de generalização das situações, na medida em que os comportamentos poderão estar ou não relacionados com o contexto em que ocorrem.
Poderá, ainda, revestir-se de particular interesse a relação existente entre ambiente e comportamento [p.183].

- Amostra de sujeitos
A amostra de sujeitos está intimamente relacionada com os restantes tipos de amostra, pois no caso de ser necessário observar mais do que dois sujeitos, é aconselhável a utilização desta em simultâneo com a amostra de intervalo, isto é, a cada sujeito deverá corresponder um determinado intervalo de observação [pp.183,184].
Anguerra (1981) e Haynes (1978) propõem as seguintes estratégias:
  • Selecção localizada de indivíduos – Consiste na escolha dos sujeitos de forma estratificada (em função de seu sexo, idade ou qualquer outro critério de conduta), procedendo-se, de seguida, à observação dos sujeitos escolhidos em função dos intervalos estabelecidos;
  • Selecção de intervalos de observação em função do número de sujeitos a observar – Poderá dispensar-se o recurso a uma amostra quando se verifique há existência de poucos sujeitos, aplicando-se os intervalos a cada sujeito, de forma rotativa;
  • Eleição de um critério de razão fixa ou variável – consiste em ordenar os sujeitos tantas vezes quanto seja possível em função do número de intervalos e do período total de observação.
  • Rotação do critério de eleição dos sujeitos a observar – tem por objectivo recolher informação acerca de todos os sujeitos [p.184].
Sintetizando, o avaliador deverá recolher uma amostra suficientemente significativa de forma a garantir a generalização dos resultados procedentes dos sujeitos observados ao conjunto de sujeitos que constitui a população objecto de interesse [p.184].


Lugar da observação (Onde observar?)

O método por observação tem como objectivo a recolha de dados sobre os comportamentos de um sujeito no local habitual onde ocorrem (observação em situação natural). No entanto, nem sempre isso é possível, sendo então utilizadas técnicas de observação em situação controlada em laboratório (observação em situações análogas).
Tal como refere Nay (1979) para que a observação seja realmente natural, o observador não deveria estar presente, na medida em que ao introduzir-se no contexto da observação poderá ser uma importante fonte de erros, e de reacção em quase todo o tipo de observação, tornando assim, a observação artificial [p.184].

- Observação em situações naturais
Nos últimos anos tem-se verificado um crescimento na importância atribuída à avaliação realizada a partir de observações em contextos naturais, justificado pelo facto da psicologia atribuir maior legitimidade à validade externa (generalização de resultados) em comparação com a validade interna (investigação experimental).
Para que a observação seja considerada em contexto natural, esta deverá ocorrer num ambiente habitual em que o sujeito observado se desenvolve e sem qualquer interferência por parte do avaliador.
A observação em contexto natural é mais frequente, segundo Haynes y Wilson (1979), para situações familiares, por exemplo para avaliar comportamentos maternos e/ou paternos, comportamentos adequados ou inadequados das crianças e interacções pais/filhos. Para estas situações são utilizados dois métodos de observação: Behavior Coding System (BCS) de Patterson e tal. (1975) e o Código de Observação (SOC) de Whaler, House y Stambaugh (1976). O código BCS contem uma série de interacções que ocorrem na família e apresenta elevadas garantias cientificas, o código SOC, mais direccionado para comportamentos perturbados, permite a observação em contextos escolares e é igualmente aplicado em contextos familiares.
No entanto, e dado o interesse manifestado por certas instituições relativamente a este tipo de avaliação, têm sido desenvolvidos métodos de observação para aplicação em instituições psiquiátricas, enfermarias hospitalares, centros de cuidados especiais (atraso mental, autismo, etc.), prisões, lares de idosos. O mesmo se tem verificado em áreas comunitárias (restaurantes, supermercados, jardins, profissões, etc.) [p.185].
Apesar deste interesse crescente, verificam-se algumas limitações metodológicas e de aplicabilidade prática, na medida em que: os próprios sujeitos em avaliação podem recusar a observação na sua vida real; os comportamentos a observar poderão ser de carácter privado, logo não observáveis ao nível ético; haver inconveniente na deslocação do psicólogo para o ambiente natural correspondente à observação; o elevado custo da observação em contexto natural (devido à necessidade do elevado número de horas de observação e de observadores, para que se obtenham registos com o mínimo de garantias da sua estabilidade e objectividade).
Assim, segundo Nelson (1983) a observação em situações naturais poderá ser mais vantajosa quando realizada por pessoas próximas do observado (controlando-se a objectividade), ou quando o avaliador é parte constituinte do meio natural (contexto escolar, institucional e comunitário), meios de tradução (filmagens, reproduções, espelhos unidireccionais, etc) o qual requer consentimento informado, ou ainda, através da aplicação de testes de execução e registo de respostas em situações naturais. Uma outra forma, é através de vestígios de conduta (diários, cartas, etc.), os quais implicam custos elevados e requerem autorização quer do próprio sujeito em observação, como de pessoas relacionadas com ele [p.186].

- Observação em situações artificiais
A observação em situações artificiais implica a criação de um contexto artificial (ambiente envolvente, introdução de estímulos, etc.) para uma determinada situação (objecto de estudo) com o propósito de observar a actividade do sujeito, recorrendo a métodos análogos ou artificiais.
A validade da observação em contexto natural dependerá do grau de artificialidade e da situação de observação utilizadas, sendo que é questionável, se o comportamento do sujeito em condições artificiais será semelhante ao que ocorre na sua vida real. Considera-se no entanto que estas apresentam uma maior validade interna, na medida em que as situações ocorrem em situação experimental controlada e por outro lado perdem validade externa e consequentemente a possibilidade de serem generalizadas [p.186].
Vejamos agora duas formas distintas de reproduzir artificialmente uma situação natural. A primeira consiste em construir provas mais ou menos estandardizadas e estruturadas, através das quais se introduzem estímulos ou situações complexas, com o objectivo de observar o comportamento do sujeito com o maior realismo possível. Referimo-nos aos testes situacionais, cujos dispositivos de observação e meios mecânicos de auxílio, poderão ser igualmente utilizados em ambientes naturais, sendo que neste caso a situação é provocada pelo examinador e não espontânea. Este poderá ser utilizado em selecção de candidatos para um posto de trabalho; avaliação de interacções entre pares, famílias, grupos, etc., recriando-se para efectuar este tipo de avaliações, quer situações concretas e semelhantes às da vida real, quer recriando o ambiente tais como salas de estar, jogos, escola, etc. Foram ainda criados testes situacionais mais simples (Teste BAT) em que se apresentam determinados estímulos aos sujeitos, os quais poderão desencadear um comportamento inadequado (diferentes comportamentos fóbicos e de ansiedade) [pp.186,187].
A segunda, com vista a aumentar a artificialidade da situação e a redução do realismo, prevê a criação de uma situação, como se esta realmente tivesse ocorrido. São os designados de role-playing (também designados de ensaios de conduta). Estes, à semelhança dos testes situacionais, permitem criar situações fictícias de interacção do sujeito com pessoas e objectos que figuram a situação representada, com o objectivo de avaliar a reacção e respectiva evolução do comportamento do mesmo perante uma determinada situação considerada importante para este. Para a aplicação destas provas é, normalmente, necessária a presença de um técnico e de um auxiliar que actue numa situação fictícia e permitem avaliar múltiplas situações com diferentes objectivos [p.187].
Embora ainda em fase experimental (segundo Fernández-Ballesteros), a Avaliação de Testes Virtuais (VAT), constitui um outro método para observação em situações artificiais na medida em que permite reproduzir diferentes situações naturais [p.187].
Podemos assim concluir que a aplicação da observação em situações artificiais depende, da sua aplicação em laboratório, da sua especificidade, da probabilidade de ocorrência e da sua reactividade. Este método parece ser importante no processo interventivo-valorativo, dada a sua sensibilidade na aplicação de tratamentos. A sua validade externa depende da estrutura e conteúdo dos acontecimentos a observar. No entanto, a aplicação deste método de observação deverá ser analisada minuciosamente e consideradas as vantagens e desvantagens antes da sua utilização [p.188].


Garantias Científicas da Observação


A observação apresenta, tal como todos os procedimentos de recolha de informação, uma série de garantias que comprovam o seu valor científico. No entanto, também ela está sujeita a alguns enviesamentos aquando da recolha de dados, os quais serão agora descritos.

- Fontes de erro provenientes do sujeito observado
Um dos principais problemas da observação reside no facto de o sujeito poder alterar o seu comportamento pelo simples facto de se saber observado. A tal atribui-se o nome de reactividade. Existe, contudo, um conjunto de indícios capazes de ajudar a identificar e, assim, controlar este problema:
  • Mudança sistemática na frequência com que se manifestam o(s) comportamento(s) objecto de estudo;
  • Aumento da variabilidade do comportamento sem que se verifiquem alterações nas condições ambientais;
  • Expressão verbal de que se está a gerar reactividade (por parte do(s) sujeito(s) observado(s) ou mesmo por parte das pessoas que lhe são próximas);
  • Discrepância entre os dados oriundos da observação e aqueles recolhidos com outros procedimentos (no que respeita a um mesmo comportamento);
  • Diferenças encontradas entre o observado e um critério objectivo previamente conhecido [p.188].
Por outro lado, os factores que poderão estar na origem da reactividade são os seguintes:
  • O processo observacional introduz novos estímulos no ambiente, os quais podem converter-se em estímulos discriminativos para o sujeito;
  • O grau de reactividade varia consoante o grau em que o sistema de observação modifica o ambiente natural;
  • Características individuais, tais como o sexo, idade, nível social, expectativas, etc;
  • O tipo de comportamento, bem como as suas propriedades (adequação, frequência, etc.);
  • Factores inerentes à biologia dos seres vivos (reactividade como propriedade dos organismos vivos) [pp.188,189].
Algumas medidas podem ser tomadas no sentido de controlar os efeitos da reactividade:
  • Utilizar observadores participantes sempre que possível;
  • Utilizar dispositivos ocultos e/ou à distância (câmaras de filmar, gravadores);
  • Minimizar a interacção observador-sujeito ou outras propriedades discriminativas;
  • Incentivar os sujeitos para que ajam da forma mais natural possível;
  • Utilizar um largo período de habituação;
  • Utilizar diversos sistemas de observação e diferentes observadores, de forma a averiguar acerca da validade dos resultados;
  • Utilizar procedimentos de observação livres de reactividade, tais como: a) medidas de erosão, de “rastreio” e de arquivo; b) produtos da conduta retirados da situação natural; c) observações simples, como aquelas registadas em situação natural por um observador independente que não intervém de forma alguma na situação observada [p.189].
- Fontes de erro provenientes do observador
No que respeita ao grau de participação, existem três possibilidades: observador não participante, observador perito e participante e, finalmente, observador chegado ao sujeito que é treinado para observar. Quando o observador é não participante, o sujeito não tem conhecimento dele. Este tipo de observação minimiza, geralmente, os efeitos da reactividade do observado, ao mesmo tempo que proporciona uma maior objectividade à observação. O observador participante é o mais comum em situações de avaliação, sendo que o seu grau de participação varia consoante a situação em análise. O observador chegado ao sujeito origina uma minimização da reactividade do sujeito, mas também uma diminuição na objectividade e precisão da observação [p.190].
As expectativas do observador podem ser, também, uma fonte de enviesamento, nomeadamente no que respeita à eleição do sistema de observação, ao registo das condutas e à selecção do desenho estatístico para análise dos dados procedentes do observado. Este tipo de viés pode ser evitado utilizando, por exemplo, observadores treinados que desconheçam as particularidades do caso [pp.190,191].
O treino do observador relativamente à tarefa de observação é algo fulcral no que concerne à obtenção de dados objectivos e precisos. Caso contrário, podem ocorrer, por exemplo, erros de tempo e de interpretação. O treino deve prolongar-se, ainda, por intervalos regulares, de forma a obter-se uma constante recalibração do sistema de observação [p.191].
As características gerais do observador (sexo, idade, habilidades, etc.) podem também influir nos resultados da observação [p.191].

- Fontes de erro provenientes do sistema de observação
O tipo de registo escolhido pode afectar quer a fidelidade, quer a validade dos dados. Para que tal não aconteça é importante que, nestes instrumentos, se verifiquem as seguintes particularidades: a) clareza nas definições condutuais; b) reduzido número de categorias ou condutas; c) utilização de um código estandardizado, cuja construção deva possuir garantias científicas suficientes; e d) conhecimento suficiente do sujeito por parte do observador, no caso de se utilizarem escalas de conduta ou classificações sobre atributos [pp.191,192].


Algumas questões sobre fidelidade, validade e exactidão da observação

No respeitante às garantias que os dados observacionais recolhidos (com ou sem procedimentos estandardizados) devem fornecer, existem quatro questões fundamentais a ser colocadas:

- Em que medida os dados recolhidos por um observador são generalizáveis aos recolhidos por outros observadores?
Basicamente, o que se pretende é constatar em que medida os dados observados dependem da pessoa que realiza a observação. Para tal, existem procedimentos que permitem a quantificação da percentagem de acordo inter e intra-observadores: são os índices de concordância, os quais se obtêm em função da unidade de medida utilizada. Existem, assim, três unidades de análise: ordem de ocorrência, frequência e duração. O índice de concordância em função da ordem de ocorrência permite uma adaptação à situação de busca do grau de concordância entre registos inter ou intra-observadores, quando o que interessa é avaliar a concordância na ocorrência e na ordem de registo das diferentes condutas. O índice de concordância em função da frequência é calculado com base no grau de acordo entre observadores, tendo em conta o grau de concordância devido ao acaso. Para tal, existe um índice global (C global) que implica o cálculo da concordância aleatória (C global aleatório). O índice de concordância em função da duração é também utilizado para comprovar a concordância entre observadores, tendo neste caso como unidade de medida a duração da conduta observada.
A generalização entre observadores pode ser incrementada pelas seguintes condições: a) utilização de claras definições condutuais que não possibilitem inferências; b) utilização de intervalos de observação; c) treino adequado e semelhante dos observadores; d) “recalibração” dos procedimentos de observação [pp.192-195].

- Até que ponto aquilo que é observado num determinado momento é generalizável a outros momentos da vida do sujeito?
Só é possível generalizar resultados quando os dados que registamos num determinado período de observação se repetem noutros períodos. Assim, existem três procedimentos principais para estimar esta forma de fidelidade das observações:
  • Correlações obtidas entre duas observações registadas em dois ou mais momentos por meio de coeficientes de fidelidade teste-reteste (correlação de Pearson ou Spearman);
  • Apreciação visual da linha base registada;
  • Utilização da fórmula de Spearman-Brown como medida da consistência interna das distintas categorias ou manifestações comportamentais observadas [pp.195,196].
- Até que ponto os dados de observação procedentes de uma situação são generalizáveis a outras situações?
Encontra-se aqui implícita a questão da validade ecológica daquilo que é observado, sobretudo no caso de os dados terem sido obtidos em situações artificiais, sendo pois necessário perceber se poderão ser generalizáveis à vida real. Para resolver esse problema, o avaliador poderá recorrer aos dados da amostra intersituacional, a escalas de apreciação dotadas de especificidade situacional ou ainda proceder a observação em situações naturais de forma a confrontar os resultados de ambas a situações [p.196,197].

- Até que ponto os dados avaliam o construto que pretendemos observar?
Apesar de existirem autores que defendem que esta questão se encontra relacionada com a validade, e outros que se encontra relacionada com a fidelidade, a verdade é que, acima de tudo, o cerne se encontra nas inferências que se podem realizar a partir dessas observações. Assim, para que se possam realizar inferências é necessário, antes de mais, que se tenham utilizado igualmente outros métodos (entrevistas, questionários, auto-registos, etc.) de forma a poder realizar-se uma posterior contrastação dos resultados obtidos [p.197].



Anexo I (Clicar na imagem para aumentar)






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